As questões ambientais tornam-se a cada dia pauta indispensável nas discussões estratégicas sobre o crescimento do país e o seu papel no cenário mundial. O desenvolvimento sustentável é a palavra de ordem e os profissionais de Logística estão atentos a essa temática com o direcionamento dos estudos para a chamada “Logística Verde”. Para entender melhor essas questões o Site da Logística entrevista o Prof. Vitório Donato, especialista na área e autor do livro “Logística Verde – Uma Abordagem Sócio-Ambiental”.
Site da Logística: O que é Logística Verde?
Prof. Vitório Donato: É a área da logística que se preocupa com os aspectos e impactos da atividade logística sobre o seu entorno (comunidade e meio ambiente). Este é o termo usado para definir um instrumento de gestão que irá mensurar os aspectos e impactos da atividade logística e desta forma criar mecanismos para: conter o aumento abusivo de emissão de resíduos ao meio ambiente, o armazenamento desprotegido de materiais, seu mau uso e/ou ausência de reaproveitamento. Lembrando que estamos em um ambiente com recursos finitos. Pela primeira vez a logística se importa com o meio ambiente e com as pessoas.
Para diminuir a emissão de dióxido de carbono, agredir menos o meio ambiente e incomodar menos as pessoas, os combustíveis fósseis (aqueles que são originados do petróleo e, por conseqüência com a presença de enxofre em sua composição) devem, sempre que possível, ser substituídos por combustíveis “amigos” do meio ambiente, ou seja, combustíveis renováveis ou os biocombustíveis. A logística está começando a despertar para esta realidade, porque sabe que vai ser exigência dos clientes que tem uma governança corporativa com o foco em projetos de cunho ambiental.
Site da Logística: Qual a diferença em relação a Logística Reversa?
Prof. Vitório Donato: A logística reversa é a área da logística que trata do retorno de produtos, embalagens ou materiais ao seu centro produtivo. Esse processo já ocorre a alguns anos nas indústrias de bebidas (retorno de vasilhames de vidro) e distribuição de gás, tanto os especiais como o de cozinha, com a reutilização de seus vasilhames, isto é, o produto chega ao consumidor e a embalagem retorna ao centro produtivo para que seja reutilizada e volte ao consumidor final em um ciclo contínuo. Já a Logística Verde tem uma abrangência muito maior, ou seja, a Logística Reversa esta dentro do universo da Logística Verde.
Site da Logística: As empresas brasileiras estão preparadas para implantar a Logística Verde? Quais seriam os requisitos?
Prof. Vitório Donato: Sim. Há mais de duas décadas, as empresas brasileiras vêm incorporando programas de qualidade e responsabilidade ambiental em suas estratégias de desenvolvimento de produtos e processos, de modo cada vez mais determinante. A preocupação com os impactos ao meio ambiente que as atividades produtivas causam, é o item mais importante na gestão empresarial moderna. O custo das correções e sanções atualmente pode inviabilizar qualquer negócio. Tomemos como exemplo o recente vazamento de resíduos de águas barrentas e poluídas na bacia do rio Danúbio, provenientes do rompimento de uma barragem para armazenamento de resíduos de uma fábrica de alumínio no sul da Hungria. A Hungria possui mais duas grandes áreas de armazenamento de resíduos tóxicos similares aos derramados, com lama vermelha altamente alcalina derivada do processamento de bauxita, o primeiro em Almásfüzitő que armazena 12 milhões de toneladas em 40 hectares, a 80 km de Budapeste. Os custos decorrentes de: contenção do vazamento, remediação e indenizações são elevadíssimos.
Site da Logística: Essa temática não é mais uma “onda” ou “modismo” que passará com o tempo?
Prof. Vitório Donato: A economia mundial na atualidade é caracterizada pelo alto consumo de carbono e um dos maiores problemas é que a atividade econômica intensiva esta eliminando os mecanismos naturais de defesa da terra, que são os sumidouros naturais de carbono. Ainda são muitos os questionamentos, mas ninguém tem dúvidas hoje de que, as mudanças no clima global é uma realidade. O IPCC no seu quarto relatório de avaliação lançado em 2007 na cidade de Bankcoc, Tailândia, afirma que ainda dá tempo de salvar o planeta e mostra os melhores caminhos para reduzir as emissões de gases de efeito estufa. Um destes caminhos é o de maior controle da cadeia de suprimentos com o foco nos modos de transportar. Em uma dimensão global, a atividade de transportar é responsável por cerca de 70% do CO2 lançado na atmosfera do total das emissões da atividade humana. Portanto há necessidade de reduzirmos estas emissões de CO2, um dos gases causadores do efeito estufa. Para que isso aconteça, é preciso mudar hábitos e comportamentos, o que inclui também a maneira de se fazer negócios.
Site da Logística: A adoção da Logística Verde não vai onerar ainda mais o “Custo Logístico” do Brasil?
Prof. Vitório Donato: A preocupação com a preservação do meio ambiente está diretamente ligada ao planejamento estratégico das empresas responsáveis, onde produtos, processos e serviços são revistos e planejados com esse objetivo. Fornecer, transportar, armazenar e distribuir produtos de uma forma que cause o menor impacto possível ao meio ambiente é a base do princípio da Logística Verde, seja pela: diminuição de emissões, eliminação de vazamentos, destinação responsável dos resíduos, melhor planejamento das embalagens, redução no consumo e reciclagem, por acreditar que a prevenção ainda é a melhor solução.
A incorporação da variável ambiental na gestão empresarial se tem convertido em uma necessidade para as empresas que querem se perpetuar e crescer no mundo de hoje. Neste contexto vemos que as questões ambientais fazem, mais do que nunca, parte do mundo dos negócios, sejam eles: explorações de minas e obtenção de matérias-primas, indústrias de transformação ou serviços. A área da logística projeta, planeja, supre e controla todo o apoio ao ambiente produtivo influenciando fortemente no uso eficiente dos recursos.
Empresas que estão adotando procedimentos operacionais com vistas a reduzir os impactos ambientais de suas atividades estão obtendo um maior retorno financeiro, segundo o DSJI (Dow Jones Sustainability Group Índex). Trata-se da principal ferramenta para a escolha, nas bolsas de valores, de ações de empresas com responsabilidade social e ambiental. Este índice foi criado pelo Dow Jones e a Sustainable Asset Management (SAM), gestora de recursos na Suíça especializada em empresas comprometidas com a responsabilidade social e ambiental. O índice é formado por 312 ações de empresas de 26 países. O DJSI foi criado em setembro de 1999 pelas instituições: Dow Jones e a Sustainable Asset Management. As empresas classificadas por este índice observaram redução nos custos operacionais, é o que já fica comprovado também por empresas quando implantam a normas da série ISO.
Site da Logística: Como essa competência poderá ser implantada nos cursos da área de Logística?
Prof. Vitório Donato: Com o agravamento do problema da agressão ambiental desenfreada, apenas reciclar não resolve o problema, evitar o consumo ou consumir de maneira consciente tem um efeito mais abrangente. Atualmente já se podem tomar atitudes preventivas individuais ou coletivas simples, de grande repercussão quando somados. Administradores estão desenvolvendo novas relações entre negócios, sociedade e o ambiente natural, de forma a reduzir a intensidade do processo de dano ambiental global, através da neutralização ou ainda, até parar com as práticas abusivas contra a natureza. Para este fim se faz necessário uma mudança de comportamento. O processo de mudança de comportamento deve passar por diversas etapas e uma das primeiras é a educação. O profissional egresso dos diversos cursos de formação em Logística deverá ter uma parcela da carga horária em educação ambiental para que esteja em sintonia com as demandas do mercado.
O Professor Vitório Donato é engenheiro de materiais, especialista em Logística e mestre em Gestão das Organizações. Trabalhou em empresas de grande porte como Ceman, Braskem e Jaakko Poyri. Consultor tecnológico e docente universitário da Faculdade de Tecnologia SENAI CIMATEC. Autor de livros técnicos na área de logística.